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Dançarinos no Sunset do Zouk Hour 2023 | Crédito: Beatriz Rey

Entre níveis

Tempo de leitura: 4 minutos

Compreenda como se sente uma pessoa intermediária na dança de salão

Escrito por: Mileni Francisco | novembro de 2023

Do nada, em um baile, você percebe que explora as viradas da música, brinca em diferentes movimentos, explora a base e consegue se compreender com o corpo naquela dança. Assim é uma pessoa intermediária, que a partir do básico consegue explorar diferentes possibilidades e se divertir sem se preocupar com os erros. Quem está nesse nível faz muitas aulas e busca aprimorar seus conhecimentos indo em eventos para aprender cada vez mais. Na sala de aula, realiza movimentos e sequências com mais facilidade, reconhece seus limites e consegue ensinar/ajudar iniciantes. Para Luiz Felipe, 26 (AC), há outro item para definir: “Me considero intermediário porque consigo passar um sentimento na dança”. 

Expressar sentimentos em uma dança pode não ser algo fácil para todos desse nível. Há algumas inseguranças que influenciam no desempenho como o medo de fazer sempre a mesma coisa e de não entregar novidades. “A minha maior insegurança sou eu mesma, de duvidar de mim, de achar que não vou conseguir. Às vezes as pessoas chega ‘Eita Marília, tu dança tão bonita’, ai meu deus, eu também queria achar isso, sabe? Eu queria muito achar isso”, desabafa Marília Lessa, 38 (PE), com experiência de cinco anos de dança. O fardo de duvidar de si interfere bastante. Contudo, o ato de dançar proporciona infinitos aprendizados, ao desenvolver tanto o físico quanto o mental, a pessoa passa a conhecer até o âmago do próprio corpo. 

Ser intermediário é lidar com o conflito entre priorizar ou não aprender novos passos. Luiz acha que a dança não é sobre isso. Com seis anos praticando Zouk Brasileiro, o aluno/dançarino sugere esquecer passos e focar no conhecimento e conexão corporal, pois assim os movimentos vão surgir.

“Hoje eu entendi que a dança pra mim não é cobrança. Dança pra mim é uma alegria, é me divertir, é não me comparar”, enfatiza Marília. 

Uma curiosidade desse nível é que a percepção da evolução acontece de forma inesperada. No meio de um baile, observa que conseguiu fazer uma movimentação mais difícil, sente que executa os movimentos com mais qualidade e consciência. Durante o processo de evolução, é muito importante dar e receber feedbacks para a pessoa reparar seu desenvolvimento e ficar feliz pelo progresso. Quando o dançarino se torna intermediário, não dança pensando em agradar o outro, faz isso pra se sentir bem, se agradar. 

Dançarinos no baile do Zouk Lovers 2023 | Crédito: Léo Silva

O misto de sentimentos da pessoa entre níveis é diferente. O intermediário sente que já é muito bom para dançar com iniciantes e quer se desafiar dançando com pessoas mais avançadas. Quem chega no nível intermediário lembra de quando era iniciante e se sentia mal por suas limitações. “O intermediário tá em um lugar onde quer ser visto dançando bem. Então evita dançar com iniciantes porque ainda não tem o controle total da sua dança, tem consciência quando dança com pessoas que tem um desempenho melhor” explica Carol Correa, 29 (RJ), professora de dança de salão.

“Essa tendência faz com que sempre opte por pessoas mais avançadas. Mas o crescimento tá no contrário. É importante valorizar as pessoas que estão começando, as pessoas que acham que não tem um desenvolvimento tão bom, porque é isso que vai fazer a pessoa evoluir”, completa Carol. Para Suzana Luniere, 39 (AM), é importante ter empatia ao dançar com pessoas iniciantes, “por mais que a dança não seja tão prazerosa pra ele, pode aprender alguma coisa ali”. À medida que evolui, a humildade de reconhecer que não sabe tudo e de enxergar que precisa se desenvolver é a peça fundamental para o crescimento. 

Para além do momento corporal, a pessoa intermediária participa de forma mais ativa na comunidade da dança, vai em bailes, congressos e tem amigos do meio. Entende que precisa “beber de outras fontes” e ir atrás de mais conhecimentos. Às vezes, a cidade onde a pessoa pratica não tem muitos eventos e iniciativas de dança para ajudar no processo de aprendizagem e precisa viajar. Ricke Gonçalves, 39 (MG), conta que participa de congressos para se capacitar, mas as informações são passadas de forma rápida e pode ser difícil assimilar tudo. Outra dificuldade é voltar para sua cidade e aplicar o que aprendeu. “As pessoas daqui não frequentam congressos. Então quando chego aqui e tento fazer, não consigo colocar em prática. É difícil fazer isso porque apesar de ter aprendido a técnica, a outra pessoa não tem a técnica”, esclarece Ricke. Isso se aplica a quem exerce o papel de conduzir. Já no caso de pessoas conduzidas, alguns conhecimentos se perdem por não continuar praticando os movimentos aprendidos em um congresso, já que alguém precisa conduzir a movimentação. 

Na busca pela imersão em dança, Luiz Felipe saiu do Acre pela primeira vez com destino ao Rio Zouk Congress (RZC). Relata que foi a ocasião mais marcante da sua vida na dança. “Foi o momento que eu mais estive perto do Zouk [Brasileiro] puro, sabe? Da comunidade do Zouk. Tinha três pessoas que dançavam Zouk quando comecei e fui para um baile que tinha mais de 500 pessoas [no RZC], só dançando Zouk, de todos os lugares do mundo. Foi um momento muito marcante da minha vida.” 

Ainda sobre as marcas que a dança deixa na vida das pessoas, Marília se sentiu impactada pelo ambiente acolhedor que recebeu. Estava passando por um momento difícil com seu pai e se sentiu muito acolhida pelas pessoas de sua turma.

“Parece que todo mundo sabia o que estava acontecendo porque todo mundo vinha me abraçar sem saber que eu tava precisando daquilo. Ali eu consegui respirar”, ressalta.

Depois desse dia, deixou de fazer aulas particulares para voltar às aulas em grupo para estar com as pessoas que a fazem sentir bem como se fossem sua família.