Mulheres enfrentam barreiras históricas para serem reconhecidas na dança de salão
Escrito por: Mileni Francisco | novembro de 2023
Historicamente, ser mulher na dança de salão significa enfrentar muitos desafios para ser respeitada como dançarina e como pessoa. A desvalorização do papel de Follow, o julgamento ao conduzir, as cobranças injustas, a desigualdade salarial, a escassez de oportunidades às profissionais e a luta contra o assédio são alguns dos desafios para (r)existir como mulher na dança. “Ser mulher na dança é resistência, é você ser chata, é você não se misturar com essa panela imunda que existe na dança, tá ligado? Porque querendo ou não é como se fosse uma elite e tem que lembrar que nem todo mundo é elite, né?”, reforça a professora de Lambada Grace Lira, 23 (PE).
Em sua primeira experiência como professora de dança de salão, Rubia Frutuoso, 38 (SP), estranhou que a única voz a ser respeitada era a do homem e que existia um certo estranhamento com a figura feminina falando dentro da sala de aula. Quando foi convidada para sua primeira parceria, percebeu que o convite não era para, de fato, atuar como professora, mas sim para embelezar. “A primeira vez que eu abri a minha boquinha em sala de aula foi um silêncio mórbido”, atesta.
Nem todas as mulheres se sentem à vontade ou têm a oportunidade de falar em aula, às vezes quando o professor pede ou quando é algo sobre a parte da pessoa conduzida é que são convidadas a se expressar. As perguntas dos alunos costumam ser dirigidas ao professor e não à professora, ficando como segunda opção. “Até mesmo as próprias mulheres, quando vão fazer uma aula particular com alguém, não importa o tamanho do seu conhecimento, a preferência na escolha vai ser masculina. A menos que ela queira saber sobre ‘enfeites’, aí escolhe a mulher”, relata a professora Irla Carina, 32 (MA).

Natural de Recife (PE), a professora de Zouk Brasileiro Mariana Villar, 22, compartilha que ser mulher na dança é ser subestimada o tempo todo e sentir a necessidade de ficar provando a todo momento que é boa o suficiente.
“A gente que é mulher precisa mostrar duas vezes mais competência para ter o mesmo respeito [que um homem] e olhe lá pra conquistar alguma autoridade”, complementa Rubia.
As relações de poder e de credibilidade dos homens sobre as mulheres se refletem nas danças a dois. “Não existe prazer em relação de poder”, garante a artista Andressa Siqueira, 26 (RJ). Rubia recomenda deixar evidente qualquer coisa que deixe uma mulher desconfortável, pois “se não te acharem doce/agradável, ótimo, porque aí eles vão se afastar e você deixa o seu universo mais saudável”.
Em oposição, a realidade de ser homem na dança é, em geral, vinculada à orientação sexual, pressupondo que são gays. Caso contrário, se é hetero, dizem que está ali para “ficar com as mulheres”, como se um homem não pudesse dançar apenas porque gosta. Há certa necessidade de provar a masculinidade no meio dançante, pois o machismo não prejudica somente as mulheres, é danoso para todos. Felipe Lira ouvia de muitos profissionais que não podia rebolar mais ou ser mais feminino que sua parceira, “tive que buscar aulas de teatro para poder explorar essa masculinidade que ninguém nunca soube me explicar o que é ser masculino”.


Kamylla Chagas, Maelly Pöerch e Camila Magalhães no Floripa Zouk 2023 | Crédito: Beatriz Rey
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